Ultimamente ando com tanta dificuldade em deitar o nariz de fora dos lençóis ...
Mas depois lavo a cara, espreito o quintal da vizinha enquanto bebo uma caneca de café com leite e o meu olhar é atraído para rasgos de cor que rompem o cinzento dos dias; sorrio, respiro fundo e saio para a rua.
Quando o sol deita o nariz de fora
da almofada das nuvens
o autocarro da manhã
abre a boca na primeira paragem.
Quando o sol deita o nariz de fora
o pai pega na mala,
enrola o sono no travesseiro
e desce a escada a correr.
Quando o sol deita o nariz de fora
a mãe sacode as migalhas de pão fresco
e põe a chaleira a cantar
com a água a ferver.
Quando o sol deita o nariz de fora,
o gato enrosca-se mais
no primeiro raio de luz
e espera as sopas de leite.
Quando o sol deita o nariz de fora,
a vizinha zanga-se
com as chinelas
que brincam às escondidas.
Quando o sol deita o nariz de fora,
no céu a lua
envergonhada esconde-se
a dizer " até logo".
E de repente a cidade
parece um formigueiro
num monte de açucar.
Ainda bem que hoje o sol deitou o nariz de fora da almofada das nuvens :)
Ilustradora : Cristina Malaquias
Coleção Caracol - Plátano Editora